Como comprar um veleiro? A minha experiencia foi assim.

by Redação

Um dia, finalmente consegui reunir o valor estipulado para o sonhado veleiro. Procurava,
procurava e nada. Num sábado estava na sala, ao computador, aborreci-me, fechei a máquina
e disse:
_ Mariana, já não compro o barco. Desisto de comprar! A partir de hoje programamos as nossas férias e antecipadamente alugamos o ‘Bugio’. O Fernando é 5 estrelas, não cria nenhum problema e eu, por outro lado, cuido do veleiro como se fosse meu. Pronto.


Não compro mais!
A Mariana concordou sem muito interesse pois, na verdade, já não aguentava ouvir sempre o
mesmo disco (disco de vinil com a agulha avariada…)


No Domingo logo cedo, fui verificar os emails e lá aparecia um email de um site de vendas de
barcos, a dizer que tinha um veleiro à venda que provavelmente seria do meu interesse. Fui
ver as fotos e fiquei apaixonado. Mas já tinha ido ver barcos cujas fotos eram lindas, mas… de
quando o veleiro era novo, há uns anos atrás, e as fotos não foram atualizadas, normalmente
as fotos eram recentes e o veleiro velho… Mas desta vez, liguei para o proprietário e gostei da
conversa e das informações. O veleiro estava nos Açores, na Ilha Terceira. Como faria para ir
ver? Lembrei-me, então, que o Fernando estava a passear nos Açores com o ‘Senso’. Fui
procurar o barco em que ele estava nessas aplicações, tipo ‘Marine Traffic’, procurei o ‘Senso’
e a rota que aparecia era o veleiro a chegar aos Açores, exatamente na Ilha Terceira. Não
podia acreditar, era muita coincidência. Voltei a ligar para o proprietário e disse que uns
amigos estavam a chegar à Terceira e se ele se importava de mostrar o ‘Bóreas’. Liguei para o
Fernando e confirmei que ele estava mesmo a chegar a Angra do Heroísmo, na Ilha Terceira,
contei a situação e pedi para ele avaliar o negócio. Fiquei na expectativa, ansioso e impaciente.
O telefone tocou:


Marco? _Diz Fernando. _Olha, o veleiro está muito bom. Estamos a conversar aqui no ‘Senso’ e se tu não comprares, acho que nós compramos. Não podia ter uma avaliação mais positiva, mas ainda tinha um problema. Eu precisava fazer uma oferta pois ainda teria de trazer o veleiro dos Açores para Lisboa e o dinheiro não chegava para tudo. Gritei: Mariana!


_ Estou aqui em baixo, na lavandaria.


_ Não sabes o que aconteceu!


Mariana deve ter revirado os olhos e pensado: Não, outra vez, não! mas disse apenas.


_ Então o que aconteceu?


Fiz uma narrativa pormenorizada do desenrolar dos acontecimentos e a resposta foi
exatamente a que deveríamos esperar numa situação dessas, ou seja:
_ Mas tu não acabaste de dizer que não ias mais comprar?

_ Disse pois, mas… sabes… Acho que vou fazer uma proposta. Que achas?


_ Faz. Ele vai entender os motivos da proposta. Acho que ele aceita.


Fiz a proposta e o Alexandre aceitou. Na semana seguinte fomos aos Açores. O Alexandre
pront

ificou-se a nos apanhar no aeroporto. Perguntei, ao chegar, se ele indicava algum hotel. Ele
respondeu:
_ Hotel? Ficam no barco e dormem lá. Aproveitam, mexam em tudo e confirmem se está tudo
ok.


Já era noite e seguimos para a Marina de Angra do Heroísmo. Damos uma vista de olhos e
combinámos de, no dia seguinte, sairmos com o veleiro. O tempo estava a fechar e começava
a ventar, acima do Monte Brasil, nuvens densas e negras anunciavam mau tempo. Fomos
rapidamente jantar. Na volta quase não conseguimos chegar secos. Caiu um verdadeiro dilúvio
e o vento uivava nos cabos e estais. Nós, por outro lado, cansados e o barco, mesmo muito
bem atracado, balançava e balançava, e nós dormíamos e dormíamos. Não olhei nada no
‘Bóreas’, só no dia seguinte, pela manhã e que dei uma vista d’olhos, o veleiro estava
impecável e, após tanta chuva, verifiquei que não tinha entrado nem uma gota de água pelas
gaiutas.
Quando o Alexandre chegou, vinha com uma cara apreensiva e perguntou:
_ Balançou um bocado, não foi?

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Concordei, mas disse que tínhamos dormido super bem. Acho que ele ficou mais descansado.
Devia ter pensado que era desta que desistíamos do negócio.
Saímos com o ‘Bóreas’ mas tivemos que voltar rápido pois o tempo estava muito mau. Mal deu
para abrir as velas.
Fechámos o negócio. Fizemos um contrato de compra e venda e paguei. Daí para a frente foi a
burocracia de tratar da mudança do registo de propriedade.
A partir desse dia, vendedor e comprador, tornámo-nos grandes amigos. Nunca se negou a dar
explicações, a ensinar e, principalmente, nunca perdeu a paciência quando tinha que explicar a
mesma coisa 3 ou 4 vezes. É certo que, às vezes, dizia para a minha filha Marina: ‘Ó Marina, já
não aguento mais explicar a mesma coisa para o teu pai dezenas de vezes, vem cá que te
explico!

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